Sou Pretendente a Adoção

Me chamo Angela Souza tenho 42 anos e sou pretendente a adoção  : ) 

Há pouco tempo atrás me dei conta de que sou uma pretendente a adoção, mas não penso que este adjetivo foi conquistado no momento em que decidi participar da primeira palestra na Vara de Infância, eu realmente me vi uma pretendente à Adoção, recentemente, no momento em que entendi que a maternidade pela via adotiva não tem como objetivo principal  encontrar crianças para pessoas como nós que queremos maternar e sim encontrar famílias para crianças e adolescentes que se encontrem fora do convívio familiar e social. A partir desse ponto percebi que depois de exatos 9 meses realmente me sinto uma pretendente: Alguém capaz de acolher, cuidar e amar uma criança que não tenha laços sanguíneos comigo. 

Se este entendimento tornou minha caminhada mais fácil? Em partes, não! Não é fácil depois de ter entregue os documentos na Vara e ter acesso ao seu numero de processo e  semana após semana você olhar e ver que nada mudou, que a última atualização  se deu em julho de 2020 e de lá pra cá nada aconteceu. Por que tanta demora é o primeiro questionamento e uma grande barreira a ser transposta. Como estou transformando isso? A cada encontro virtual do Grupo de Apoio a Adoção entendendo que a espera se faz necessária, que temos trâmites jurídicos que devem ser seguidos e respeitados para que o processo de adoção corra de forma segura, inclusive para nossos futuros filhos. O que antes gerou angústia aos poucos vem dando lugar a preparação, seja ela emocional, física e financeira. Vejo este momento como também sendo de decisão, é nesta fase de nossa caminhada que precisamos definir o perfil da criança que queremos, Será que é fácil?  Em algum momento você já pensou que não necessariamente o que você quer pode ser o melhor para a criança? Eu tenho me questionado muito a respeito disso, afinal estamos fazendo uma escolha que mudará a vida de outra pessoa. Meu primeiro impulso era escolher um perfil de bebê recém nascido, mas aprofundando minha busca por conhecimento neste universo da adoção, em leituras, em lives  e em depoimentos de pessoas que já adotaram, me questionei sobre as minhas reais condições de cuidar e acompanhar um bebezinho que cresce rapidinho e se tornará um adolescente num piscar de olhos. E se por egoísmo eu insistir e não puder dar toda atenção necessária? E se eu estiver tirando a oportunidade dela ter pais mais novos (idade) que possam a acompanhar por um período maior de sua vida. Crianças adotadas podem trazer traumas e serem jovens inseguros por isso a presença de pais até mais que a fase adulta será de grande importância. Esse é o sentido da adoção que venho formando para mim, é pensar na criança como um outro indivíduo que precisa ser respeitado, seja em suas necessidades ou em sua história pregressa. Abri minha mente e principalmente meu coração para aceitar filhos que eu tenha condições (em todos os sentidos)  de adotar por inteiro, penso em ser a mãe do filho real que estará a minha espera. Além da preparação faço deste momento e farei de muitos outros que virão pela frente, um espera otimista e alegre acreditando que na hora certa estaremos juntos e será lindo de viver.

Sugiro com carinho que participem dos Grupos de Apoio à Adoção, não só aquelas duas palestras obrigatórias para o processo, mas façam disso um compromisso sério com a sua preparação. Leiam, Assistam Lives, Encontros de Adoção de outras estados, sigam os Grupos de Apoio à Adoção nas redes sociais e vocês sempre terão assuntos interessantes para assistir, refletir e se emocionar.

Meu filho é de cor.

Vamos iniciar  esta reflexão com um poema escrito por “menina angolana”:

Quando nasci, era preto.

Quando cresci, era preto.

Quando pego sol, fico preto.

Quando sinto frio, continuo preto.

Quando estou assustado, também fico preto.

Quando estou doente, preto.

E, quando eu morrer continuarei preto !

E tu, cara branco.

Quando nasce, é rosa.

Quando cresce, é branco.

Quando pega sol, fica vermelho.

Quando sente frio, fica roxo.

Quando se assusta, fica amarelo.

Quando está doente, fica verde.

Quando morrer, ficará cinzento.

E vem me chamar de homem de cor ?

 

Muitas pessoas adotam “ um filho de cor” ,seja pardo, mulato ou negro. Estes pais, sejam de que cor de pele for, aceitaram esta criança para ser seu filho. Aceitaram ter um filho com características físicas diferentes das suas.

Aceitaram  enfrentar o preconceito, a discriminação, a diferença hierárquica entre as pessoas. Muita coisa mudou  mas o preconceito existe, sim!

Este preconceito não se baseia no comportamento ou habilidades do indivíduo. São práticas condenadas, está na Constituição, é crime mas acontece   e o indivíduo “ de cor” sofre. Adulto sofre. E a criança?

Dependendo da escola que a criança frequentar ela poderá enfrentar apelidos como “cor de cocô” ,”macaco” entre outros. Sofrimento total. Insegurança. Queda de confiança e autoestima. 

Há  crianças , filhas de pais de pele clara que surpreenderam a criança esfregando sabão em pó nos braços para clarear a pele, para sentir-se igual.

Esses pais que adotam um filho “ de cor” terão que estar preparados para lidar com estas situações .Fortalecer o filho diferente da sua genética. Enfrentar as queixas que “ tem cabelo ruim”, fazendo-o entender que este  cabelo é uma marca genética de sua raça e que não precisará ser alisado.

Pais terão que  educar esta criança para que quando for adolescente e adulto   saiba lidar com a sociedade, até com a Polícia. Uma das formas será através da educação familiar , da instrução escolar e fortalecimento   emocional, com vínculos afetivos que lhes tragam segurança.

Pais que aceitam um “ filho de cor” deverão se preparar para este enfrentamento. Vamos lembrar que a alma não tem cor e que o sangue é vermelho ,de todos os povos, de todas raças ,tudo igual. Muda apenas a distribuição do pigmento melanina na pele.

Abrigamento prolongado.

As crianças ou adolescentes que são abrigados ou institucionalizados ali chegam por uma circunstância de vida difícil. Abrigo não é um hotel ou pousada para passar um tempo de lazer. Ali estão por determinação judicial, por medida protetiva por um lado mas com consequências diversas por outro.

Todo abrigado tem uma história de sofrimento. Entra num lugar estranho, levado por vezes até por policiais, recebido por pessoas desconhecidas e certamente sentirá medo. Será bem recebido dentro dos protocolos necessários. Será apresentado à casa, aos outros moradores, receberá alimentos e terá uma cama para dormir.

Sua vida futura será dirigida pela Justiça, ou reintegrado à família genética, ira para adoção ou ficará ali até ter 18 anos. Futuro incerto dependendo dos trâmites legais e sem tempo determinado.

Viverá no meio de um “bando” de seres na mesma situação, sem atendimento individualizado nas suas necessidades psicológicas, pois por mais que os cuidadores se dediquem, a atenção individual será prejudicada.

Seu direito`a convivência familiar e comunitária foi violada. Se frequentam escolas conveniadas será sempre “o aluno da instituição”,sofrerá preconceito e sem direito a receber convites para as festas de aniversário dos colegas de turma. Tudo à sua volta irá fortalecer sua carência afetiva e baixar sua autoestima. Nem sempre será um “ bom aluno” pois na instituição não há um eficaz acompanhamento escolar.

Aquele que tem bom potencial intelectual acompanhará o trajeto escolar e o que tem nível mediano é candidato  ao atraso de aprendizagem. Esse atraso poderá acontecer por dificuldade de concentração pois sua mente está repleta de sua historia anterior, de abandono.

Tem uma história de vida desconstruída. Não tem “ primos ou tios” não tem com quem compartilhar brincadeiras continuas, não tem com quem formar vínculos duradouros. Na instituição é um seguido  lugar de mudanças, sejam cuidadoras que são trocadas, crianças que entram e saem.

Vemos também que no desenvolvimento  físico notamos em alguns uma espécie de travamento. O corpo e a mente endurecidos. A expressão corporal não tem agilidade, não há mobilidade solta,  espontânea. Existem os que apresentam doenças psicossomáticas e após a adoção bem sucedida as doencinhas desaparecem. Muda o humor e o aspecto. Os olhos passam a ter brilho.

Felizmente as crianças e os jovens tem o poder da recuperação. Precisam encontra novos pais muito pacientes, compreensivos e dedicados. O amor e atenção, o carinho ,o afeto são milagrosas pomadas cicatrizantes. Levam para a nova família sua historia de vida que precisa ser respeitada.

Adoção e a pandemia

Em meados de março de 2020 recebemos a notícia que algo chamado “Corona vírus (COVID 19)” se instalou entre nós. Tomou conta do Planeta,  o que é chamado de pandemia. Nos fez entrarmos em isolamento, usar máscaras e vivermos uma vida diferente. Vivermos de um jeito que não sabíamos viver.

O mundo  se viu atropelado por “ uma coisa” invisível mas poderosa. Uma coisa que provoca doença e morte. Algo para ser respeitado. Algo que está além de nossas forças, nossas escolhas, conhecimento e inteligência.

O que a adoção tem a ver com esse assunto? Muito.  Crianças e adolescentes isolados nas instituições sob os cuidados dos responsáveis, recebendo atividades escolares “on live” e sem ter muitas pessoas disponíveis para ajudar. Terão computadores disponíveis para tantos usuários? Ou quem vá até as escolas buscar as atividades?

São crianças e jovens que  já tem vida anterior complicada, com tudo isso  ficará mais evidente o atraso escolar. Outra coisa : como fazer aproximação e convivência real com os futuros pais? Será que virtualmente terão a possibilidade de se conhecerem realmente?

E nas comunidades periféricas como estão as crianças? Será que seus familiares estão pacientes ou a negligência e maus tratos aumentaram ? Ainda: as crianças que perderam pais por morte covid e se encontram numa orfandade, estão sendo cuidadas?

A pandemia prejudicou o trabalho profissional de muita gente, veio o desemprego deixando os pais angustiados, depressivos, dependendo de caridade ou solidariedade, será que conseguem ter paciência e amor para dar aos filhos se eles mesmos estão carentes ?

Daqui alguns tempos será possível constatar as sequelas emocionais dessas crianças que vivem a pandemia. Algumas passam por falta de atenção ,carinho, paciência, alimentos e convívio social com outras da mesma idade.

Em lares mais estruturados, com computadores disponíveis para as aulas “on line” , tendo pais que tiveram que virar professores, mesmo assim impossibilitados de uma socialização. Sem aniversários, adolescentes sem baladas, sem passeios nos shoppings, tendo que viver no convívio adulto. Jovens que não podem exercitar as paqueras e as paixonites próprias da idade pois virtualmente não é a mesma coisa.

E os “ idosos” que viraram grupos de risco e com isso os netos não podem desfrutar do seu amor  e até acompanhar seu funeral, caso aconteça.

Entendemos que tudo é temporário. Como dizem: vai passar! Com isso despertamos pelo valor da família, da solidariedade e aprendemos agradecer  e respeitar mais a vida ,

Que mundo estamos vivendo?  Por que ?  Até quando?

Chegada do filho: visitas.

A chegada de um novo membro familiar, seja um filho consanguíneo ou pela via adotiva, trará visitantes, curiosos ou participativos que  chegarão até em momentos inoportunos. Seja qual for a procedência desse filho haverá necessidade de adaptação entre filho x pais ou pais x filho. O ideal será  que os visitantes combinem um horário para visitar.

E as visitas ao filho que chega pela via adotiva? Será preciso mais calma. Esse filho precisará  ir conhecendo familiares e amigos aos poucos. Como enfrentará uma multidão de desconhecidos? Será exposto aos curiosos que irão observar, analisar e fazer “ aqueles” comentários inadequados.

Os pais adotivos não devem expor o filho colocando fotos na rede social. Atualmente este meio de comunicação que atinge todas pessoas e poderá acontecer de um familiar deste filho identificá-lo, principalmente se for mais crescido. Há pais que ficam eufóricos com a chega do filho e já divulgam no “ facebook”. Há perigo  : será que a adoção dará certo? E se não der? 

A família extensa  nem sempre está preparada para a vinda desse novo “parente”. Olhares inquisidores ,buscas de semelhanças, perguntas  aos pais como “ sabem quem é a mãe”? Por que tão grande ? Não tinha um mais clarinho? Será que vai dar certo? 

Muito importante :  os pais tem conhecimento da história de vida do filho? Já mencionamos por aqui : a historia pertence aos pais e ao filho .Não divulgar.

Durante as visitas é comum ofertarem presentes. Será bom conversar com amigos e familiares sobre isso. Tudo será bem vindo mas na medida certa .Roupas novas ou seminovas, brinquedos, cadeirinha para o carro, acessórios em geral. Por vezes essa “ ajuda” acontece só no início.

Há pais adotivos que programam as visitas aos poucos. Recebem as pessoas ou levam o filho para que conheçam . Há os que fazem um “ Chá de Filho” para a apresentação. Cada situação é peculiar, depende de cada família, idade do filho e suas condições psicológicas. A história pessoal do filho poderá estar marcada por dificuldades  pois  sua vida anterior passou por caminhos diversos e nem sempre estão claros para os novos pais.

A porta do amanhã  familiar terá que ser conduzida com calma, segurança e doçura. O filho poderá se assustar,  não entender e até se sentir ameaçado pelos visitantes.

No aspecto visitas de familiares e amigos podemos pensar também onde os pais levarão o filho para conhecer lugares novos, na própria cidade onde vivia ou se irá para outro município.

Foi acolhido, cuidado numa vida coletiva. Fez passeios promovidos pela instituição ou voluntários, padrinhos, frequentou  escola  mas sempre de forma grupal. Agora  poderá visitar lugares com a nova família e receberá explicações  e atenção.

Cada cidade tem suas características e lugares para passeios. Tem aeroporto? Ele conhece escada rolante? Elevador? Já foi ao cinema? Entrou em supermercado e ajudou nas compras? Sabe que existe cartão de crédito? Quanta novidade para aprender. Afinal não é só celular que existe !

Nos passeios  será importante chamar atenção para tudo, desde a forma das folhas das plantas, as nuvens, e tudo que servir para estimular. Há criança  acolhidas que dormem cedo e nunca viram a Lua passeando no céu.

Algumas crianças aprendem tudo rapidinho e outros que tem assimilação lenta. O papel dos pais é construir,estimular com paciência, persistência, dedicação e amor.

Fonte-“ Gestação adotiova” Hália P. Souza-Ed Juruá—2020—pág 31

Mulher que entrega seu filho para adoção

Geralmente a mulher  que entrega seu filho para adoção é socialmente julgada como “ desalmada”, este entre outros preconceitos. Pertencem  às camadas  sociais desfavorecidas, algumas jovens ou solteiras ou mesmo abandonadas pelos parceiros, vivendo em famílias desestruturadas, nas ruas, por vezes envolvidas por drogadição.

Nos processos de entrega do filho raramente o genitor aparece. São mulheres sós, sem condições econômicas e psicológicas, vítimas sociais.

A gestação é algo como que determinado para a mulher e sua renúncia é mal vista, seja para as que doam seus filhos como pra as que não desejam gestar. A mulher “ tem a obrigação” de ter amor materno.

Algumas genitoras mais conscientes ou mais informadas entregam legalmente seu filho para as Varas da Infância e da Juventude, porém, há as que abandonam em espaços públicos. Nestes casos o abandono é ato criminoso.As crianças deixadas em lugares perigosos podem perder a vida e as que sobrevivem são acolhidas tornando-se adotáveis,

Estas genitoras são socialmente invisíveis, vítimas de miséria, violência, desemprego. São julgadas insanas mas na realidade são vulneráveis. O filho quase sempre é resultado de uma gravidez indesejada e preferem fazer a entrega legal ou voluntária em vez de deixá-los em lugares de risco. Na entrega legal poderão ser amparadas e a criança irá para uma família  habilitada para adoção.

São prejulgadas até mesmo nos ambientes hospitalares onde por vezes são vítimas de atravessadores. São   violentadas moral e psicologicamente.

A maioria dessas mulheres são adolescentes ou jovens adultas e com empregos  sem grande qualificação profissional ou baixa escolaridade e com relacionamentos ocasionais ou passageiros. Se sentem desamparadas , com medo, solitárias.

Entregam por não terem condições de criar ou porque já tem outros filhos não conseguindo exercer a maternidade de maneira ampla. Não tem apoio, suporte e assistência. Não abortaram.

Encontros de Adoção

O Movimento Nacional em prol da adoção de crianças e adolescentes acontecem há muitos anos. É formado por grupos de pessoas que vivem a adoção sejam pais pela via adotiva, filhos que passaram pelo processo adotivo ,  Psicólogos, Assistentes Sociais e Magistrados.

Essas reuniões ou encontros acontecem por regiões e também há o Encontro Nacional Anual. Servem para trocas de informações, reflexões  e as palestras fazem com que os conhecimentos sobre o tema se reciclem e atualizem. Além de falas especiais ocorrem depoimentos das pessoas que são pais afetivos que, com seus depoimentos, nos mostram os desafios que passaram nessa adoção, como as superaram, bem como as alegrias de terem formado suas famílias por este caminho.

No Brasil temos os GRUPOS de APOIO às ADOÇÕES e são denominados por GAAs. Estes GAAs podem ser vistos no site da ANGAAD que é o representante oficial dos grupos ,ASSOCIAÇÂO NACIONAL e coordenado por uma diretoria eleita com representatividade de 2 anos.(www.angaad.or.br)

As encontros nacionais anuais  recebem o nome de ENAPAS .Os ENAPAs acontecem desde 1996 ,ainda movidos pela grande força de Fernando Freire, que tanto lutava pela causa. É um lugar onde se discutem diversos temas, experiências e fortalece as alianças entre os GAAs.

ENAPA significa encontro, amizades, esclarecimentos e conversas com as pessoas que já adotaram seus filhos e convidados que contribuem com ricas informações. Há grandes trocas de experiências e atualização das leis que regem o Instituto da Adoção.

Para que os novos frequentadores entendam a caminhada dos Encontros listamos:

I-1996-Rio Claro-SP

II-1997-Itapetininga-SP

III-1998-Florianópolis-SC

IV-1999-Natal-RN

V-2000-Rio de Janeiro-RJ

VI-2001-Curitiba-PR

VII-2002-Mogi das Cruzes-SP

VIII-2003-Itajai-SC

IX-2004-Belo Horizonte – MG

X-2005-Goiânia-GO

XI-2006-Niteroi-RJ

XII- 2007-Belém-PA

XIII-2008-Recife _ PE

IX-2009-São Paulo-SP

Antes de Ser Mãe

Texto de Silvia Schmidt

Antes de ser mãe, eu fazia e comia os alimentos ainda quentes. Eu não tinha roupas manchadas, tinha calma nas conversas ao telefone.

Antes de ser mãe, eu dormia o quanto queria. Nunca me preocupava com a hora de ir para cama. Eu não me esquecia de escovar os cabelos e os dentes.

Antes de ser mãe, eu limpava a casa todo dia. Eu não tropeçava em brinquedos e nem pensava em canções de ninar.

Antes de ser mãe, eu não me preocupava se minhas plantas eram venenosas ou não. Imunizações e vacinas então eram coisas em eu não pensava.

Antes de ser mãe, ninguém vomitou e nem fez xixi em mim , nem  me beliscou sem nenhum cuidado, com dedinhos de unhas finas.

Antes de ser mãe, eu tinha controle sobre a minha mente, meus pensamentos, meu corpo e meus sentimentos e dormia a noite toda.

Antes de ser mãe, eu nunca tive que segurar uma criança chorando, para que médicos pudessem fazer testes ou aplicar injeções. Eu nunca chorei olhando pequeninos olhos que choravam. Nunca fiquei gloriosamente feliz com uma simples risadinha. Nem fiquei sentada horas e horas olhando uma criança dormindo.

Antes de ser mãe, eu nunca segurei uma criança, só por não querer afastar meu corpo do dela. Eu nunca senti meu coração se despedaçar quando não pude estancar uma dor. Nunca imaginei que uma coisinha pequenina pudesse mudar tanto a minha vida e que pudesse  amar alguém tanto assim e não sabia que eu adoraria ser mãe.

Antes de ser mãe, eu não conhecia a sensação de ter meu coração fora do meu próprio corpo. Não conhecia a felicidade de alimentar um bebê ( ou uma criança)  faminto. Não conhecia esse laço que existe entre a mãe e a sua criança. E não  imaginava que algo tão pequenino pudesse me fazer-me sentir tão importante.

Antes de ser mãe, eu nunca me levantei a noite toda, a cada dez minutos para me certificar de que tudo estava bem. Nunca pude imaginar o calor, a alegria, o amor, a dor e a satisfação de ser uma mãe. Eu não sabia que era capaz de ter sentimentos tão fortes.

Por tudo e apesar de tudo, obrigada meu Deus por eu ser agora um alguém tão frágil e tão forte ao mesmo tempo. Obrigada Deus por permitir-me ser Mãe !

Reflexões Sobre Os Desafios do Viver e do Conviver na Família por Adoção.

Texto de Renata Pauliv de Souza Casanova

Psicóloga

CRP 08/06487

Viver a maternidade e a paternidade é o sonho de muitas pessoas e a adoção é uma forma de realizá-lo.

Esta vivência começa a ganhar forma por meio do processo de habilitação, da espera até a chegada da criança/adolescente que se tornará filho. Muitas expectativas, sonhos, fantasias, ansiedades, angustias permeiam esse momento.

Quando a criança/adolescente chegam a esta promessa de nova família para alguns o sonho se transforma em pesadelo: a realidade se mostra muito mais difícil, dura do que a doce ilusão de que tudo seria fácil.

Ora, ter filhos dá muito trabalho! Eles exigem tempo de qualidade, atenção, afeto, resiliência dos pais para lidarem com as rejeições, agressões, tristezas, angústias. É uma verdadeira “maratona emocional”, por vezes sem trégua. Uma dedicação total.

Justamente nesta prática diária que muitos postulantes se assustam ou desanimam. Descobrem que esta luta cotidiana cobra um preço que, para alguns, é muito caro. Vivenciam o estresse emocional, desenvolvem sintomas e quadros depressivos, ansiosos, apresentam sentimentos de impotência, desvalia , baixa autoestima e sentimentos ambivalentes em relação àquela criança/adolescente.

Em muitos casos frequentar grupos de apoio a vinculação adotiva e pós adoção e/ou psicoterapia facilita o enfrentamento desta fase, no intuito de superar suas dores emocionais, aceitar este novo membro da família como ele é, trabalhar com os desafios da parentalidade , da filiação, da frataria , das relações intrafamiliares e interfamiliares.

Contudo, há os que desistem, devolvem. Destes abortos adotivos tiram-se reflexões e ensinamentos.

O que, de fato, faltou nestes casos?

– foi um “erro” no processo de habilitação?;

– foi uma precipitação dos pretendentes em aceitar a criança/adolescente?;

– foi medo dos postulantes em dizer “não” e ser excluído do cadastro?;

– foi o início da convivência familiar no final do ano, tempo de férias escolares e do judiciário?;

– foi despreparo dos postulantes?;

– foi despreparo da família extensa dos pretendentes, que por vezes incentiva a desistência diante das crescentes dificuldades e desafios vivenciados?;

– foi falta de comunicar à Vara de Infância e Juventude as dificuldades vivenciadas na família, por medo de perder o filho?;

– foi a manutenção do vínculo de lealdade da criança/adolescente a sua família de origem?;

– o processo de luto da criança/adolescente não estava finalizado?;

– os jovens ainda mantinham contato com suas famílias naturais por meio das redes sociais?;

– a criança/adolescente não desejava ser adotada? Eles não entenderam que isso significava deixar a família de origem no passado?;

É sabido que  para a adoção florescer e frutificar a preparação é imprescindível.  E ela está nas mãos dos postulantes. É mister sensibilizá-los quanto a isto.

Não basta amor para se adotar, é preciso conhecimento;

Não basta conhecimento para se adotar, é preciso transforma-lo em sabedoria.

E como se transforma conhecimento em sabedoria? Trazendo-o para a vivência diária. E como fazer isso se ainda não há filhos? Buscando o convívio com crianças e adolescentes, observando-os junto as suas famílias em parques, escolas e outras vivências sociais – isso auxilia a desmistificar e desvitalizar fantasias e romances acerca da filiação e suas facetas; conversando com amigos, familiares que já tem filhos  e lhes questionando sobre as dificuldades, dissabores e decepções que ocorrem na vivência das famílias.

Afinal, todos os pais têm expectativas que, em algum momento, serão frustradas pelos filhos. Por que estes filhos são maus, ingratos? Não, porque as expectativas são dos pais. É bem difícil viver ou cumprir a expectativa do outro. Ser o que o outro impõe é se despersonalizar.

É importante, também,  lembrar que por algum tempo os postulantes poderão precisar colocar sua vida (pessoal, social, profissional) em segundo plano. Essa pausa é sentida, por alguns, como um peso, uma ausência de si mesmo.

Ter filhos dá trabalho. Preparar-se para esta labuta cotidiana auxiliará no processo de adaptação intrapessoal, interfamiliar a essas exigências e demandas.

Cada vez mais os grupos de apoio à adoção têm mostrado dados positivos quando da frequência assídua dos encontros preparatórios, reflexivos, e do acompanhamento nos estágios de aproximação, convivência e pós adoção.

Buscar ajuda , apoio não é sinal de fracasso, incompetência. É um ato de amor. É também uma forma de cultivar o sonho da parentalidade, fortalecer vínculos afetivos e evitar (ou, ao menos, minimizar) o aborto adotivo decorrente da ausência desta busca.

Família substituta

Quem será que achou que este termo seria adequado para designar a família adotiva?  Não gosto. Nunca gostei. Sou mãe adotiva. Não sou mãe substituta!

Hum……está na Lei……pois é !

O que é substituir ? É ficar no lugar do outro por uma circunstância. É temporário. É alguém que ocupará o lugar do outro que está se ausentando, é uma função por um período. Poderá ser por um horário, semana até meses, mas nada definitivo.

É assim que entendo e portanto não sou membro de uma família substituta. Sou mãe sempre. Sou mãe 24 horas por dia. Sou mãe por anos. Sou mãe até hoje com filhas adultas, profissionais e também mães.

Ninguém me substituiu nas noites que tiveram insônia, febre, internamento hospitalar. Ninguém me substituiu para dar banho, vestir , ensinar andar de bicicleta, para levá-las para escola, ajudar nas tarefas escolares , levar nos aniversários dos amiguinhos.

Ninguém me substituiu quando enfrentaram vestibular , quando subi no altar no seu matrimônio. A mãe substituta …..arf……estava junto na maternidade e me tornei avó. Será que sou avó substituta…..noooossssa…..!!!  Não havia pensado nisso.

Nós , mães adotivas, que escolhemos a maternidade com  força total, que assumimos e estamos sempre presentes em todos os momentos, seja de alegria ou tristeza, dores, medos, apoiando, dando limites, passando valores de vida, somos apenas mães. Não estamos ali substituindo a “mulher gestante” que não quis ou não pode ficar com o filho. Estamos presentes na vida do filho de corpo e alma , sentimentos de afeto, acolhimento e aceitação.

Não temos um “ filho substituto”. Temos um filho que não tem o nosso sangue. Aí está outra bobagem…..o sangue…..marido e esposa não tem o mesmo sangue e ninguém questiona  ……rsrsrs…….,mas se incomodam com o sangue do filho.

O que é isso? Falta de assunto ? Falta de respeito?  Preconceito? Até inveja…” vocês são corajosos…”,ou aquela comparação com o tipo físico dos pais e da criança. Sim a família “substituta”  assume seu desejo, com fé, coragem , enfrentamento e constrói uma família desejada. Família pensada, enfrentando tudo que precisa, seja a documentação e tudo que a Lei deseja e com razão.

Família substituta se prepara para ser família . Faz curso preparatório, assistem palestras, fazem leituras,tudo para apenas substituir?  Não mesmo !

NOTA—tudo isso vale também para o “ pai substituto”