A metáfora “filho do coração” usada por muitas famílias sempre me incomodou. Motivo: fui professora de Ciências Biológicas e lecionava conteúdos de anatomia humana. Estudávamos a circulação, a reprodução entre outros temas.
Sabemos que o coração é um maravilhoso órgão que bombeia o sangue e que os bebês se desenvolvem no útero das mulheres. Por isso não conseguia aceitar que um filho nasce num coração. Buscava entender isso, entender o motivo de não falarem em sentimentos.
Nos tempos antigos os pais apresentavam os filhos que chegavam como “ peguei para criar”. Com o passar do tempo essa terminologia foi caindo. Talvez por um preconceito interno ,os pais não desejavam falar em adoção ou não sabiam como informar isso aos filhos e familiares. Talvez esteja aí a origem desta metáfora.
O desejo da adoção nasce no cérebro dos pais. Este órgão comanda tudo no nosso corpo, seja a fisiologia como nos sentimentos. Há nele uma região chamada “ lobo frontal” ,sob a nossa testa, onde fica situada a função das emoções, pensamento, raciocínio, planejamento. No lobo temporal estão nossas memórias e comportamentos vividos pelos pais e pelo filho na sua vida pregressa. Então o filho que nos chega pela adoção é “ filho do cérebro” ? Não. No cérebro nos decidimos sermos pais.
Todo filho é filho biológico. Fato inegável ! Aquele que nasce e permanece na família onde nasceu é filho consanguíneo ou genético e o que muda de família é o nosso filho afetivo ou adotivo. Terminado o processo adotivo ele será FILHO e ponto final. Se alguém questionar sua origem, fale simplesmente que ele passou por um processo jurídico de filiação e agora é “meu FILHO”.
Nos cursos presenciais de preparação para adoção ouvi muitas histórias narradas por estes pais que estavam se preparando para uma segunda adoção. Uma das mães nos narrou que quando o filho estava frequentando a turma de educação infantil e estudavam a família , ele mencionou que era filho do coração. As demais crianças da turma choraram pois sabiam que tinham nascido da barriga de suas mamães e ali tinha cocô. Queriam também ter nascido do coração. Imaginem o aperto da professora que não sabia o que fazer.
Outra mãe, professora, num primeiro dia de aula de ensino médio, fez uma dinâmica de apresentação para conhecer seus novos alunos que tinham por volta de 15 anos de idade. Uma jovem disse seu nome e que era filha do coração. Um colega de turma, maroto, riu e disse “ Ah é…eu sou filho do fígado”. Constrangimento total.
Mais uma historinha : um pai tinha feito uma cirurgia cardíaca e ficou com grande cicatriz em seu peito. O filho insistia em dizer que tinha nascido do coração do pai. Este pai foi chamado na escola para esclarecer o assunto .
Nas redes sociais ,de quando em quando, as pessoas postam que entraram com pedido de adoção e ilustram com uma imagem de tronco de mulher com um feto no peito, escrevendo que “ estou grávida no coração”. Que confusão ! Melhor dizer que está numa gestação adotiva.
Tendo em vista estas questões, sempre pensava numa forma de ajudar as pessoas, particularmente as crianças e jovens entenderem que a expressão “ filho do coração” significa um gesto de amor e carinho.
Por anos desejava sinalizar uma solução e nasceu a ideia de um livreto com frases curtas e desenhos explicando isso. Construí um pequeno livreto, sem cor, para que a criança ou os jovens terem uma rápida leitura, poderem colorir e até completarem as ilustrações. O título é : “ Adoção: de onde eu vim ? Da barriga ou do coração? Veja sua capa aqui no site em “ publicações”.
Está disponível em www,jurua.com.br e desejo que seja compreendido ao que se propõe.
Filho do coração significa que é amado.
Filho do coração é receber carinho !
Filho do coração é ser cuidado!
Filho do coração é ser acolhido do jeito que é !
Todo filho consanguíneo deverá ser também filho do coração.
Todos queremos ser “filhos do coração” ,amados, acolhidos mas entendendo que significa sentimentos e não origem .